A explosão dos grandes modelos de linguagem (LLMs), que hoje aprendem com base em volumes de dados equivalentes a bibliotecas inteiras, gerou um receio comum: o de que essa fome por informação seria incompatível com a proteção da privacidade das pessoas. É importante ter em mente, aliás, que os LLMs são modelos de linguagem, não de conteúdo. O objetivo sempre foi comunicar, não criar.
Assim, a verdade é que o treinamento de IAs gigantescas e o respeito a leis de proteção de dados, como a LGPD, não só podem andar de mãos dadas, como essa parceria é um bom caminho para construir uma tecnologia confiável e sustentável para o futuro.

Governança de Dados
A chave para essa compatibilidade está em uma governança de dados inteligente, que começa muito antes de o modelo de IA sequer começar a ser treinado. Na prática, os dados brutos, sejam eles coletados da internet ou de bancos de dados privados, passam por uma rigorosa “limpeza”.
Nesse processo, via de regra, técnicas de anonimização removem informações que poderiam identificar uma pessoa, como nomes, CPFs e endereços. Além disso, os desenvolvedores podem usar “dados sintéticos” — dados fictícios criados por computador que imitam os padrões dos dados reais, mas sem qualquer conexão com pessoas de verdade —, garantindo que o modelo aprenda a partir da estrutura da informação.
Tokenização
O processo de treinamento de LLMs não armazena dados pessoais da forma como um banco de dados convencional faria. Um dos processos técnicos mais importantes nesse cenário é a tokenização. De forma simples, é o ato de quebrar textos longos em pedaços menores, ou “tokens”, para que o computador possa entendê-los. É justamente nessa etapa que a proteção de dados pode ser automatizada.
Programas inteligentes são capazes de identificar tokens que correspondem a informações sensíveis e substituí-los por etiquetas genéricas. Assim, o modelo aprende, por exemplo, a estrutura de uma frase que contém um endereço, mas nunca vê o endereço real. Ele aprende o conceito, não o dado pessoal.
Em outras palavras, apesar do resultado do modelo poder, probabilisticamente, se assemelhar aos dados de treinamento, isso não significa que informações pessoais foram “memorizadas”. Essa abstração resulta na perda de referências a indivíduos específicos.
Privacidade como prioridade
Em resumo, embora o uso de dados em larga escala para o treinamento de LLMs apresente desafios, a combinação de técnicas de anonimização, a minimização, o uso de dados sintéticos, a natureza abstrata do aprendizado dos modelos e a implementação de uma governança de dados alinhada aos direitos dos titulares demonstram que o avanço da IA é compatível com a proteção da privacidade e dos dados pessoais
No fim das contas, tratar a proteção de dados como prioridade é uma vantagem competitiva. Modelos de IA treinados com dados de alta qualidade, coletados de forma ética e devidamente “higienizados”, são mais confiáveis e menos propensos a erros e preconceitos. Ao incorporar a privacidade desde o início do projeto (privacy by design), as empresas constroem a confiança do público, que é essencial para o sucesso de qualquer tecnologia. Fica claro, portanto, que é perfeitamente possível treinar modelos de IA com trilhões de parâmetros e, ao mesmo tempo, proteger os direitos fundamentais das pessoas.
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